Janio de Freitas - ­ Colunistas ­ Folha de S.Paulo 24-07-2016

Os nossos terroristas não se assemelham aos que atacam a França, os Estados Unidos, a Inglaterra, agora a Alemanha, e outros comprometidos em ações bélicas no Oriente Médio, na Ásia e na África. Os nossos terroristas não matam pessoas inocentes para fazer mal a cada país inimigo. Mas os nossos terroristas fazem certo mal como os terroristas armados.

Com a diferença de que atingem um só país. O seu. O nosso.
Nenhuma das mazelas de que somos íntimos é exclusividade brasileira. Todas estão pelo mundo afora, em graus e concentrações variáveis. Nada, muito menos as mazelas alheias, justifica ou compensa as nossas.

Embora possamos dizer, e deveríamos dizê-­lo muito e alto, que não andamos por aí massacrando povos e destruindo cidades alheias, tomando terras, roubando riquezas. Exclusividade nossa, parece, é o vício de nos alimentarmos de nossas mazelas, de usufruí-­las em um enorme gozo nacional, que faz do nosso um país patético.

Desde 2008, o mundo todo é corroído por crise econômica. Consequência de patifarias no sistema financeiro dos Estados Unidos muito maiores do que o ocorrido na Petrobras. Cada brasileiro vive ainda, de algum modo, efeitos daquele estouro, mas só uma parte ínfima da população tem ideia aqui do se passou lá, e de como nos atingiu. Explica-­se: apesar dos milhões de norte­-americanos que perderam suas casas ou suas economias, o problema foi tratado publicamente com cautela e sobriedade pelas instituições oficiais e por imprensa e TV.

No Brasil, o sensacionalismo é a regra. A veracidade é secundária, ou nem isso. A preocupação com os efeitos do espalhafato inexiste. O escândalo gera escândalo, e passa ele a ser um escândalo –não mais interno, apenas, mas o Brasil escandalizando o mundo. É o terrorismo contra si mesmo, é o nosso terrorismo.

Se esse terrorismo não ataca a vida humana em ação direta, não deixa de fazê-­lo por outros meios. O período dos altos índices de inflação legou um exemplo claro. A par de outros fatores, o escândalo feito com a inflação, a cada taxa nova ou hipótese de taxa, levava a imediato aumento dos preços e a inflação para mais alto.

Os efeitos sociais negativos dispensam referências. O exemplo se atualiza com a Petrobras. Na combinação de razões corretas e muitas leviandades, o escândalo da bandalheira de menos de meia dúzia de sujeitos, na maior empresa brasileira, atingiu em cheio não só a Petrobras, mas também a riqueza brasileira do pré­-sal.

A crise da estatal alcança as finanças dos estados e milhares de empregos. O papel do pré­-sal no futuro do país é rebaixado a objeto de negócios com que cobrir alguns buracos nas contas de hoje. Por suas proporções anormais até para escândalos, o da Petrobras escandalizou o mundo e expõe à sanha da cobiça internacional.

A Olimpíada não poderia escapar. A caça ao escândalo não teve o êxito esperado das contas e dos prazos descumpridos, tradicionais fornecedores. O terrorismo, sim, afinal teve um ato positivo: entregou­-se como pretexto.

A imprensa e a TV faziam o possível, até indicaram, inclusive com mapa, o que serão os pontos mais atraentes ou vulneráveis para a ação de terroristas. Veio, porém, do próprio governo o embalo do sensacionalismo. Por intermédio de quem mais deveria combatê-­lo: o ministro da Justiça.

Alexandre Moraes dividiu-­se entre o ridículo e a irresponsabilidade, ao se apresentar a propósito da prisão de dez talvez terroristas futuros. Com informações logo contestadas por um juiz e, de objetivo, um mínimo indício a ser verificado, aos ouvidos do mundo o ministro da Justiça incluiu o Brasil no mapa do terror.

Quando estrangeiros cuidam de sua viagem para o Brasil da Olimpíada.
No nosso terrorismo, o ministro Alexandre Moraes é mais eficiente do que os seus dez presos. Somados.

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