Via Blog Consciência
Tem ficado cada vez mais claro que a direita brasileira, desde grupos liberal-conservadores antipetistas que atuam online e offline até páginas assumidamente reacionárias e militaristas de redes sociais, usa em suas mensagens argumentativas e persuasivas uma ou mais estratégias intelectualmente desonestas. Este artigo lista catorze (mais uma bônus) dessas táticas, que, mesmo facilmente perceptíveis para quem tem senso crítico suficiente, acabam enganando pessoas pouco acostumadas com reflexões e debates no campo sociopolítico.
Todas elas demonstram como a militância direitista tem falhado – senão simplesmente se negado – em transmitir mensagens honestas, lógica e factualmente válidas e bem raciocinadas para seus atuais e futuros seguidores. Isso tem reforçado, em todo o país, a ascensão de uma cultura conservadora “orgulhosamente” apedeuta e irracional, movida muito mais por ódio, preconceitos múltiplos e fanatismo contra quem se opõe a essa direita do que por ideias e bandeiras ideológicas.
1. Contradições, incoerências e duplipensar
Uma das características mais presentes e frequentes na argumentação da militância de direita é a contradição entre o discurso e a prática, ou mesmo entre discursos distintos vindos da mesma pessoa ou entidade. É um discurso tão contraditório e incoerente que acaba definindo determinadas palavras-chave como se significassem exatamente o seu oposto, no raciocínio chamado de duplipensar.
Por exemplo, o sujeito diz “defender” a democracia apelando para a defesa explícita do autoritarismo de Estado, da repressão militar contra manifestações de movimentos sociais e do impeachment arbitrário da presidenta Dilma Rousseff à revelia de provas que a incriminem – isso quando não advoga pela supressão violenta do regime democrático em favor de um golpe militar. O mesmo indivíduo que de tarde diz “defender a liberdade” gastará sua noite declarando apoio à perseguição de minorias políticas e à supressão das liberdades individuais e direitos civis e políticos das mesmas.
O militante defende a meritocracia socioeconômica mas se opõe ferrenhamente a políticas de Estado que deem o mínimo de condições para pessoas de categorias sociais historicamente desfavorecidas poderem competir com menos desvantagem em relação a homens brancos cisgêneros heterossexuais herdeiros de famílias ricas. Opõe-se a ditaduras socialistas, dizendo que “repudia o totalitarismo”, mas não hesita em defender ditaduras de direita, como a de Pinochet no Chile e a dos presidentes generais no Brasil, e minimizar os crimes cometidos por elas. E promove um “humanismo” repleto de limites, contradições e interesses ocultos.
Tem sido bastante difícil encontrar formadores de opinião direitistas que não caiam em contradição e incoerência. É de se teorizar, aliás, que praticamente não há na direita brasileira nenhuma ideia popular (como melhoria da educação, defesa da democracia, garantia das liberdades individuais, proteção da propriedade privada, prosperidade econômica etc.) que não esteja sendo ao mesmo tempo por ela “defendida” e rasgada.
2. Falácias
A direita tenta trazer argumentos que agradem à população como um todo, em especial as classes mais baixas e a média, mas não tem conseguido fazer isso sem recorrer a falácias – argumentos que parecem convincentes à primeira vista, mas possuem uma ou mais incorreções lógicas ou apelos irracionais que invalidam a mensagem passada. As falácias aparecem na tentativa de defender como “desejáveis” ideias que na verdade são absurdas – como o descrédito ao Estado Laico, a depreciação de movimentos sociais de esquerda, a defesa de “soluções” autoritárias e violentas para a criminalidade civil, o apoio à heteronormatividade e a derrubada da presidenta Dilma Rousseff como “solução” para a corrupção.
Um exemplo clássico do uso intensivo e incessante de argumentos falaciosos é o da comentarista Rachel Sheherazade. Uma análise crítica de cada discurso conservador proferido por ela levará a pessoa verificadora à conclusão de que nada, nada mesmo, que ela diz escapa de se enquadrar em algum tipo de falácia – como falsa dicotomia, falácia do espantalho, falácia de omissão, redução ao absurdo, desqualificação pessoal (ad hominem), distorção de fatos, omissão de fontes, bola de neve, apelo à multidão etc.
O mesmo se aplica a outros formadores de opinião, que frequentemente têm seus textos refutados por contra-argumentadores de esquerda. Poucos argumentos seus, senão nenhum, livram-se de uma boa análise detectora de falácias.
3. Mitos insistidos
Algo marcante na direita é que seu sucesso e prestígio depende de se manter seu público-alvo alheio a um conhecimento aprofundado sobre os problemas sociopolíticos para os quais ela apresenta “soluções”. Sem essa noção sobre a essência filosófica, sociológica, política, econômica etc. dessas questões, cai-se fácil em argumentos cativantes que, na verdade, são comprovadamente mitos e já foram refutados.
Como exemplos de mitos já desmascarados mas ainda assim insistidos pela direita, estão a eficácia da redução da maioridade penal na diminuição das estatísticas de violência, a inerência do egoísmo e da violência à “natureza humana”, a dicotomia entre “cidadãos de bem” e “bandidos”, a legalidade e “importância democrática” da “intervenção militar constitucional” e a capacidade de autorregulação e sustentabilidade de um mercado livrado de toda e qualquer regulamentação legal.
A carência de acesso a uma educação (escolar, extraescolar e autodidática) básica decente em disciplinas de humanidades (Sociologia, Economia, Política, Filosofia, História, Direito, Geografia Humana etc.) e a invisibilização das refutações, cujas fontes têm uma audiência ínfima e inibida em comparação aos formadores de opinião de direita, proporcionam que as pessoas, em especial as mais suscetíveis a crer nesses opinadores, permaneçam crendo nesses mitos.
4. Mentiras e boatos
Boa parte dos militantes de direita, em especial os reacionários e antipetistas ferrenhos, partem para a desonestidade explícita de forjar supostos fatos que tentem incriminar seus opositores (como os presidentes petistas Dilma e Lula e os movimentos sociais). Mas não demora até que essas notícias sejam desmascaradas como boatos, mentiras.
Um exemplo que já se tornou um clássico de boataria da atualidade no Brasil é a página Revoltados Online. Frequentemente recorrem à invenção de fatos falsos contra Dilma, Lula e seu filho Lulinha, os professores reprimidos pela polícia em Curitiba em 29/04/15, defensores dos Direitos Humanos e outras pessoas e entidades, na tentativa de lhes queimar a reputação política.
Também são arrebatadoramente comuns as mentiras contra Lula, o deputado federal Jean Wyllys e a deputada federal Maria do Rosário, ex-ministra de Direitos Humanos. Nos períodos de campanha eleitoral presidencial, os boatos assumem proporções ainda mais esmagadoras contra a pessoa presidenciável do PT, como se viu em 2010 e 2014 contra Dilma.
5. Manipulações e distorções de fatos verdadeiros
Numa linha similar à dos boatos, estão as manipulações de fatos verdadeiros. Notícias que dizem X são distorcidas de modo que são transformadas em fa(c)to(ide)s que dizem XYZ (ou KWY), na tentativa de jogar a população enganada contra o indivíduo ou entidade difamado.
Exemplos de meias verdades desse tipo podem ser encontrados em páginas como a Revoltados Online. Nessa postagem de refutação de alguns boatos vindos daquela página, foi mostrado como o investimento governamental na atividade de empreiteiras nacionais em obras em outros países foi maliciosamente manipulado e “transformado” em empréstimo direto a Estados estrangeiros com governos de esquerda, como Nicarágua, Cuba, Bolívia e Uruguai. A mesma postagem exibe como a proposta do ministro Ricardo Berzoini de regulamentar a imprensa no Brasil foi distorcida e convertida numa “abominável” tentativa de controlar e censurar a mídia nacional.
Em postura parecida com a dos “Revoltados”, Rachel Sheherazade, em um discurso seu supostamente sobre intolerância religiosa, manipulou os fatos sobre uma ação judicial da Prefeitura de Florianópolis para revogar uma inconstitucional obrigatoriedade de haver bíblias cristãs nas bibliotecas das escolas municipais. A ação foi convertida, imaginária e falaciosamente, numa tentativa de proibir a presença desses livros religiosos naquelas instituições de ensino e, portanto, “perseguir” o cristianismo.
6. Baixaria e ataques pessoais
Também é muito comum ver militantes de direita partindo para um nível de argumentação ainda mais baixo e sujo. É o caso daqueles que partem para a pura baixaria e para ataques pessoais contra opositores.
As Pérolas de direita do Consciencia.blog.br trazem, todos os sábados, exemplos novos desse festival de baixaria e ofensas que se vê em incontáveis páginas de direita. Na diversidade de furiosos ataques contra membros de sua oposição, abundam, do alto de um arrebatador desequilíbrio emocional, os xingamentos contra Dilma, Lula, o prefeito paulistano Fernando Haddad, as feministas, o movimento de pessoas não heterossexuais, os movimentos de trabalhadores sem-terras e sem-tetos etc.
Nessa onda de violentos ataques verbais, muitos seguidores dessas páginas participam da baixaria nos comentários, multiplicando os xingamentos, o ódio e os rompantes de agressividade e fanatismo. Fica muito evidente, quando se lê algumas postagens antipetistas reacionárias e os comentários delas, o quanto os ascendentes movimentos de direita têm chamado a atenção muito menos por suas bandeiras e ideais liberal-conservadores do que pelo fanatismo e pelo ímpeto de violência verbal – que às vezes se converte em violência física, como foi visto em alguns dos protestos de direita de 15 de março.
7. Maniqueísmo: direita “do bem” vs. oposição “do mal”
Alguns dos movimentos e páginas de direita mais exaltados partem também para um outro tipo de baixaria: o maniqueísmo. Dividem o cenário político brasileiro, numa clara incitação à intolerância, ao ódio e ao fanatismo, em direita “do bem”, composta por “cidadãos de bem” que “lutam contra a corrupção” e “pela liberdade”, e PT e esquerda “do mal”, de caráter “diabólico”, “destruidores” do país.
Isso tem sido visto em páginas como a Revoltados Online, que foi flagrada algumas vezes tachando sua “luta” contra o governo petista de “guerra do bem contra o mal”. Também é percebido em mensagens indiretas, como a terceira imagem desse post de pérolas de direita.
Numa postura distante da maturidade e da seriedade, os maniqueístas de direita desenham a esquerda como se fosse uma sanguinária vilã, desejosa de destruir as famílias brasileiras, tomar os bens da classe média, criminalizar os relacionamentos heterossexuais e impor um regime totalitário que enterraria para sempre as liberdades individuais da população. Demonstram, nessa atitude, que não estão dispostos a debater, mas sim a intolerantemente atacar e destruir seus opositores, com ódio e autoritarismo.
8. Controle psicológico das pessoas, por meio da incitação ao medo, ao ódio e ao fanatismo
O controle das massas é um desejo de parte dos movimentos e páginas de reacionarismo no Brasil. É visível a iniciativa deles de manipular o que as pessoas pensam e creem, através de recursos escusos como o apelo ao medo contra o “comunismo” e a continuidade do mandato de Dilma, a incitação ao ódio irracional contra o PT e o açulamento do seu público-alvo de modo que se torne um “exército” de fanáticos.
Nessa incitação, as pessoas são induzidas a crer no que eles querem que creiam. São convencidas, pelo medo de ter seus bens confiscados e suas famílias desagregadas à força, de que a esquerda ou o PT querem implantar uma “ditadura comunista” – se não já implantaram – e, por isso, devem ser perseguidos e eliminados. Como exemplo disso, novamente a páginaRevoltados Online é evocada, por seu linguajar fortemente agressivo e suas tentativas de induzir crenças fanáticas, medo e ódio nos seus seguidores.
9. Preconceito
O preconceito contra a esquerda, o PT e inúmeras minorias políticas é uma constante em páginas de direita, seja de maneira explícita, seja de forma sutil. Homofobia, lesbofobia, machismo, elitismo, racismo (velado ou explícito), transfobia, xenofobia, gordofobia, intolerância religiosa, intolerância política etc. são comuns de se ver no conteúdo panfletário da direita.
É muito frequente ver ofensas misóginas, gordofóbicas e lesbofóbicas contra Dilma em páginas reacionárias. Também não é raro ver gente defendendo, do alto de seu preconceito elitista, que pessoas beneficiárias do Bolsa Família tenham seu direito político ao voto cassado. O ódio homo-lesbofóbico e misógino também é lugar-comum, já que o reacionarismo no Brasil é inspirado, em parte, no fundamentalismo evangélico e católico, no militarismo e em outras milenares tradições patriarcais.
Fica evidente que o “Brasil ideal” defendido pela direita brasileira contemporânea é um país onde, além de haver o império do autoritarismo, as minorias políticas são constantemente perseguidas, praticamente não têm direitos e são obrigadas a prestar submissão aos homens cisgêneros brancos heterossexuais cristãos (fanáticos) e ricos.
10. Autoritarismo
Por mais “liberal” ou “libertária” que às vezes se tente intitular, e por mais que use as palavras “livre” e “liberdade” em seus discursos, a parcela mais visível da direita brasileira tem o autoritarismo em sua essência. Sua “defesa da liberdade” deixa muito evidente o quanto é uma farsa, ao negligenciar por completo a defesa das liberdades individuais não econômicas para a maioria da população – pertencente a uma ou mais minorias políticas – e defender o silenciamento violento da esquerda e das demandas sociopolíticas dos desfavorecidos por parte do aparelho repressor do Estado. E é comum vê-la não só defendendo, como também praticando, o autoritarismo em suas posições.
Isso é percebido, por exemplo, quando páginas de direita consideram a simples expressão política discordante uma “violação” moral, tachando quem não concorda com uma ou mais posições defendidas de “comunistas”, “esquerdistas” e/ou “petralhas”, demonizando-os e bloqueando-os, ou então respondendo-os com grosseria e má vontade.
Essas páginas e movimentos parecem esperar que sua audiência diga amém a tudo que falam e argumentam. Dizem “defender a liberdade” mas são os primeiros a hostilizar e censurar quem pensa diferente. Tentam empurrar goela adentro da sociedade, longe de submeter à dialética aprimoradora de ideias, suas crenças político-ideológicas. É uma postura vista mais em páginas reacionárias, como o perfil do ideólogo extremista Olavo de Carvalho no Facebook.
11. Teorias da conspiração e paranoia
De vez em quando, destacam-se as teorias da conspiração na fala de formadores de opinião direitistas, como o mesmo Olavo de Carvalho. Segundo eles, há uma conspiração “comunista”, atribuída ao Foro de São Paulo, tramando a “destruição da família”, o “confisco da propriedade privada”, a “proibição” da heterossexualidade, a implantação de um “governo comunista continental” e outras supostas providências consideradas absurdas e inaceitáveis. Como “solução”, defendem ora um golpe militar, ora a eleição de algum radical mão-de-ferro de direita, entre outras que desaguam na perseguição política violenta contra a esquerda e na eliminação das liberdades políticas.
Esse conspiracionismo trabalha aquilo que na verdade é um espantalho, uma fantasia sobre os verdadeiros objetivos e interesses da esquerda brasileira. E muitos direitistas promovem essa fantasia com o intuito de instigar a população para que tenha medo da esquerda e ódio irracional contra o PT, o PSOL, outros partidos originalmente defensores dos interesses populares e os movimentos sociais. Uma população dominada pelo medo e induzida ao ódio é muito mais fácil de se arrebanhar e controlar para que sirva de massa de manobra para defender e facilitar interesses alheios, como será mostrado mais adiante.
12. Projeção psicológica, inversão de fatos
A Wikipédia define a projeção psicológica como “um mecanismo de defesa no qual os atributos pessoais de determinado indivíduo, sejam pensamentos inaceitáveis ou indesejados, sejam emoções de qualquer espécie, são atribuídos a outra(s) pessoa(s)”. É algo extremamente comum na direita brasileira.
É corriqueiro ver os mesmos opinadores ou formadores de opinião direitistas sendo autoritários e acusando a esquerda de autoritária, promovendo múltiplos preconceitos e intolerâncias e tachando-a de preconceituosa e intolerante, defendendo ditaduras de direita e tachando militantes de esquerda de “comunistas totalitários” – mesmo que sejam na verdade opositores de ideologias socialistas autoritárias -, acusando seus opositores de serem “contra a família” enquanto eles mesmos defendem a negação e rejeição contra famílias não “tradicionais” e a desagregação de muitas famílias heterossexuais nucleares, entre diversos outros exemplos.
A direita costuma tentar atribuir ao outro lado desqualidades que na verdade são características ou objetos de defesa constante dela. Tenta assim parecer palatável para a maioria da população, historicamente castigada pelas desigualdades sociais, pelas crises econômicas e por governos capengas, e assim conquistá-la pelo coração e fazê-la ter ódio e preconceito contra a esquerda.
13. Apresentação de “soluções” simples, fáceis e rápidas para problemas complexos e de tratamento difícil e demorado
Tem sido muito comum, nesses últimos anos, “denunciar” problemas como a corrupção, a iniquidade governamental e a falta de honestidade na política e apresentar supostas “soluções” simples, fáceis e rápidas. Tem-se insistido, por exemplo, que a remoção forçada de Dilma da presidência e a criminalização do PT irão “acabar com a corrupção” ou diminuí-la severamente.
Esse discurso se baseia na falácia de que o PT é o partido mais envolvido em escândalos de corrupção na história do país, muito mais do que, digamos, o PSDB, o PMDB, o DEM e o PP. Isso quando não se deixa a entender que o Partido “dos Trabalhadores” é o único partido abrigador de corruptos no Brasil.
Omite-se espertamente que a corrupção tem raízes profundas e multicentenárias, senão milenares, na história cultural e política brasileira (ou ocidental), tendo sido forte em todos os governos presidenciais, imperiais e coloniais no país. Esconde-se que bastará muitíssimo mais do que a remoção de um único partido e uma única autoridade do jogo para que ao menos se diminua e se desempodere a cultura da desonestidade e do “jeitinho”.
Outros exemplos de “soluções” mágicas apresentadas para problemas difíceis são o recrudescimento e brutalização das ações policiais para “acabar” com a violência urbana, a militarização e/ou privatização do ensino para eliminar os problemas da educação pública, a entrega do SUS a empresas privadas para “solucionar” a precariedade da saúde pública e a restauração da educação doméstica religiosa moralista e fortemente autoritária para se “combater” a criminalidade juvenil e a erotização de adolescentes.
14. (Falsas) Dicotomias
A direita reacionária brasileira é especializada em forjar e forçar dicotomias na tentativa de “entender” o mundo. Divide a sociedade entre “bons” e “maus”, “cidadãos de bem” e “bandidos vagabundos”, “direitistas patriotas defensores da liberdade e da democracia” e “esquerdistas comunistas que querem destruir a civilização e provocar o caos”, entre outras tantas divisões maniqueístas.
É esse pensamento em preto-e-branco que faz reacionários acreditarem em absurdos como os seguintes:
– É contra a pena de morte e a violência da polícia? Então tem pena de bandidos e defende a impunidade.
– Relativiza o antipetismo radical de direita? Então é petista e venerador de Lula.
– Vê algo de errado nos discursos da direita “contra a corrupção”? Então é defensor de corruptos.
– É contra as privatizações e a diminuição do Estado? Então é comunista (stalinista) e defende um super-Estado totalitário.
– Vai a protestos (de esquerda)? Então é desocupado vagabundo e não trabalha.
– Defende o direito das diferentes famílias? Então é contra a família tradicional pai-mãe-filhos.
– É de esquerda? Então é comunista e odeia “cidadãos de bem”.
– É contra o conservadorismo? Então defende que a sociedade mergulhe no caos.
– Defende algumas políticas empreendidas pelo PT? Então é petista roxo.
Bônus: arrebanhamento das massas em torno de interesses privados
Todas essas estratégias concentram-se num objetivo maior: arrebanhar as massas, controlá-las psicologicamente e torná-las massa de manobra para a defesa de interesses privados que, não percebem elas, atentarão diretamente contra sua dignidade, seus direitos, suas liberdades e suas prerrogativas democráticas.
Fica muito evidente que a maioria da direita brasileira não está afim de debater ideias e bandeiras a sério, racional e honestamente. Aliás, ela é interessada na manutenção da ignorância sociopolítica da população. A falta de conhecimento suficientemente aprofundado sobre os problemas sociais, políticos, econômicos, ambientais, jurídicos etc. do Brasil e do mundo, assim como a carência de senso crítico, torna a sociedade vulnerável a acreditar em tudo o que a direita diz através de seus ideólogos e formadores de opinião, mesmo que eles incidam nas catorze desonestidades descritas neste artigo.
Graças a esses métodos sujos, a opinião pública adere a essas crenças político-ideológicas e, de quebra, é induzida a emoções como medo e ódio e a posturas fanáticas e intolerantes de aversão àqueles que são alvos dos ataques vindos dos direitistas. Fica pronta assim a fórmula para a mobilização de protestos e outros comportamentos coletivos demandando, por exemplo, a derrubada ilegal de Dilma Rousseff do poder, a criminalização do PT e a eleição de um presidenciável conservador mão-de-ferro, sob pretextos ingênuos como o “combate à corrupção” e a “defesa da democracia”.
No final das contas, as massas acabam opondo-se ao que poderia ser a sua chance de redenção – as lutas dos movimentos sociais, as bandeiras de direitos da esquerda, o avanço da democratização na cultura política brasileira etc. – e defendendo, sem saber, interesses nada públicos, como a perpetuação e fortalecimento do poder político oculto (ou visível), do lucro e dos privilégios de grandes empresários, magnatas da comunicação e políticos conservadores nada honestos ou democratas.
Essa desonestidade sistemática da parcela mais visível da direita formadora de opiniões precisa ser denunciada com frequência. E novas estratégias precisam ser pensadas para se impedir que ela continue enganando, cativando e arrebanhando mentes e corações em torno de uma desconexa fantasia que poderá resultar em graves danos à democracia e às liberdades e direitos individuais e coletivos, incluindo até mesmo o direito à vida e à integridade físico-psicológica e a dignidade humana, no Brasil.
Todas elas demonstram como a militância direitista tem falhado – senão simplesmente se negado – em transmitir mensagens honestas, lógica e factualmente válidas e bem raciocinadas para seus atuais e futuros seguidores. Isso tem reforçado, em todo o país, a ascensão de uma cultura conservadora “orgulhosamente” apedeuta e irracional, movida muito mais por ódio, preconceitos múltiplos e fanatismo contra quem se opõe a essa direita do que por ideias e bandeiras ideológicas.
1. Contradições, incoerências e duplipensar
Uma das características mais presentes e frequentes na argumentação da militância de direita é a contradição entre o discurso e a prática, ou mesmo entre discursos distintos vindos da mesma pessoa ou entidade. É um discurso tão contraditório e incoerente que acaba definindo determinadas palavras-chave como se significassem exatamente o seu oposto, no raciocínio chamado de duplipensar.
Por exemplo, o sujeito diz “defender” a democracia apelando para a defesa explícita do autoritarismo de Estado, da repressão militar contra manifestações de movimentos sociais e do impeachment arbitrário da presidenta Dilma Rousseff à revelia de provas que a incriminem – isso quando não advoga pela supressão violenta do regime democrático em favor de um golpe militar. O mesmo indivíduo que de tarde diz “defender a liberdade” gastará sua noite declarando apoio à perseguição de minorias políticas e à supressão das liberdades individuais e direitos civis e políticos das mesmas.
O militante defende a meritocracia socioeconômica mas se opõe ferrenhamente a políticas de Estado que deem o mínimo de condições para pessoas de categorias sociais historicamente desfavorecidas poderem competir com menos desvantagem em relação a homens brancos cisgêneros heterossexuais herdeiros de famílias ricas. Opõe-se a ditaduras socialistas, dizendo que “repudia o totalitarismo”, mas não hesita em defender ditaduras de direita, como a de Pinochet no Chile e a dos presidentes generais no Brasil, e minimizar os crimes cometidos por elas. E promove um “humanismo” repleto de limites, contradições e interesses ocultos.
Tem sido bastante difícil encontrar formadores de opinião direitistas que não caiam em contradição e incoerência. É de se teorizar, aliás, que praticamente não há na direita brasileira nenhuma ideia popular (como melhoria da educação, defesa da democracia, garantia das liberdades individuais, proteção da propriedade privada, prosperidade econômica etc.) que não esteja sendo ao mesmo tempo por ela “defendida” e rasgada.
2. Falácias
A direita tenta trazer argumentos que agradem à população como um todo, em especial as classes mais baixas e a média, mas não tem conseguido fazer isso sem recorrer a falácias – argumentos que parecem convincentes à primeira vista, mas possuem uma ou mais incorreções lógicas ou apelos irracionais que invalidam a mensagem passada. As falácias aparecem na tentativa de defender como “desejáveis” ideias que na verdade são absurdas – como o descrédito ao Estado Laico, a depreciação de movimentos sociais de esquerda, a defesa de “soluções” autoritárias e violentas para a criminalidade civil, o apoio à heteronormatividade e a derrubada da presidenta Dilma Rousseff como “solução” para a corrupção.
Um exemplo clássico do uso intensivo e incessante de argumentos falaciosos é o da comentarista Rachel Sheherazade. Uma análise crítica de cada discurso conservador proferido por ela levará a pessoa verificadora à conclusão de que nada, nada mesmo, que ela diz escapa de se enquadrar em algum tipo de falácia – como falsa dicotomia, falácia do espantalho, falácia de omissão, redução ao absurdo, desqualificação pessoal (ad hominem), distorção de fatos, omissão de fontes, bola de neve, apelo à multidão etc.
O mesmo se aplica a outros formadores de opinião, que frequentemente têm seus textos refutados por contra-argumentadores de esquerda. Poucos argumentos seus, senão nenhum, livram-se de uma boa análise detectora de falácias.
3. Mitos insistidos
Algo marcante na direita é que seu sucesso e prestígio depende de se manter seu público-alvo alheio a um conhecimento aprofundado sobre os problemas sociopolíticos para os quais ela apresenta “soluções”. Sem essa noção sobre a essência filosófica, sociológica, política, econômica etc. dessas questões, cai-se fácil em argumentos cativantes que, na verdade, são comprovadamente mitos e já foram refutados.
Como exemplos de mitos já desmascarados mas ainda assim insistidos pela direita, estão a eficácia da redução da maioridade penal na diminuição das estatísticas de violência, a inerência do egoísmo e da violência à “natureza humana”, a dicotomia entre “cidadãos de bem” e “bandidos”, a legalidade e “importância democrática” da “intervenção militar constitucional” e a capacidade de autorregulação e sustentabilidade de um mercado livrado de toda e qualquer regulamentação legal.
A carência de acesso a uma educação (escolar, extraescolar e autodidática) básica decente em disciplinas de humanidades (Sociologia, Economia, Política, Filosofia, História, Direito, Geografia Humana etc.) e a invisibilização das refutações, cujas fontes têm uma audiência ínfima e inibida em comparação aos formadores de opinião de direita, proporcionam que as pessoas, em especial as mais suscetíveis a crer nesses opinadores, permaneçam crendo nesses mitos.
4. Mentiras e boatos
Boa parte dos militantes de direita, em especial os reacionários e antipetistas ferrenhos, partem para a desonestidade explícita de forjar supostos fatos que tentem incriminar seus opositores (como os presidentes petistas Dilma e Lula e os movimentos sociais). Mas não demora até que essas notícias sejam desmascaradas como boatos, mentiras.
Um exemplo que já se tornou um clássico de boataria da atualidade no Brasil é a página Revoltados Online. Frequentemente recorrem à invenção de fatos falsos contra Dilma, Lula e seu filho Lulinha, os professores reprimidos pela polícia em Curitiba em 29/04/15, defensores dos Direitos Humanos e outras pessoas e entidades, na tentativa de lhes queimar a reputação política.
Também são arrebatadoramente comuns as mentiras contra Lula, o deputado federal Jean Wyllys e a deputada federal Maria do Rosário, ex-ministra de Direitos Humanos. Nos períodos de campanha eleitoral presidencial, os boatos assumem proporções ainda mais esmagadoras contra a pessoa presidenciável do PT, como se viu em 2010 e 2014 contra Dilma.
5. Manipulações e distorções de fatos verdadeiros
Numa linha similar à dos boatos, estão as manipulações de fatos verdadeiros. Notícias que dizem X são distorcidas de modo que são transformadas em fa(c)to(ide)s que dizem XYZ (ou KWY), na tentativa de jogar a população enganada contra o indivíduo ou entidade difamado.
Exemplos de meias verdades desse tipo podem ser encontrados em páginas como a Revoltados Online. Nessa postagem de refutação de alguns boatos vindos daquela página, foi mostrado como o investimento governamental na atividade de empreiteiras nacionais em obras em outros países foi maliciosamente manipulado e “transformado” em empréstimo direto a Estados estrangeiros com governos de esquerda, como Nicarágua, Cuba, Bolívia e Uruguai. A mesma postagem exibe como a proposta do ministro Ricardo Berzoini de regulamentar a imprensa no Brasil foi distorcida e convertida numa “abominável” tentativa de controlar e censurar a mídia nacional.
Em postura parecida com a dos “Revoltados”, Rachel Sheherazade, em um discurso seu supostamente sobre intolerância religiosa, manipulou os fatos sobre uma ação judicial da Prefeitura de Florianópolis para revogar uma inconstitucional obrigatoriedade de haver bíblias cristãs nas bibliotecas das escolas municipais. A ação foi convertida, imaginária e falaciosamente, numa tentativa de proibir a presença desses livros religiosos naquelas instituições de ensino e, portanto, “perseguir” o cristianismo.
6. Baixaria e ataques pessoais
Também é muito comum ver militantes de direita partindo para um nível de argumentação ainda mais baixo e sujo. É o caso daqueles que partem para a pura baixaria e para ataques pessoais contra opositores.
As Pérolas de direita do Consciencia.blog.br trazem, todos os sábados, exemplos novos desse festival de baixaria e ofensas que se vê em incontáveis páginas de direita. Na diversidade de furiosos ataques contra membros de sua oposição, abundam, do alto de um arrebatador desequilíbrio emocional, os xingamentos contra Dilma, Lula, o prefeito paulistano Fernando Haddad, as feministas, o movimento de pessoas não heterossexuais, os movimentos de trabalhadores sem-terras e sem-tetos etc.
Nessa onda de violentos ataques verbais, muitos seguidores dessas páginas participam da baixaria nos comentários, multiplicando os xingamentos, o ódio e os rompantes de agressividade e fanatismo. Fica muito evidente, quando se lê algumas postagens antipetistas reacionárias e os comentários delas, o quanto os ascendentes movimentos de direita têm chamado a atenção muito menos por suas bandeiras e ideais liberal-conservadores do que pelo fanatismo e pelo ímpeto de violência verbal – que às vezes se converte em violência física, como foi visto em alguns dos protestos de direita de 15 de março.
7. Maniqueísmo: direita “do bem” vs. oposição “do mal”
Alguns dos movimentos e páginas de direita mais exaltados partem também para um outro tipo de baixaria: o maniqueísmo. Dividem o cenário político brasileiro, numa clara incitação à intolerância, ao ódio e ao fanatismo, em direita “do bem”, composta por “cidadãos de bem” que “lutam contra a corrupção” e “pela liberdade”, e PT e esquerda “do mal”, de caráter “diabólico”, “destruidores” do país.
Isso tem sido visto em páginas como a Revoltados Online, que foi flagrada algumas vezes tachando sua “luta” contra o governo petista de “guerra do bem contra o mal”. Também é percebido em mensagens indiretas, como a terceira imagem desse post de pérolas de direita.
Numa postura distante da maturidade e da seriedade, os maniqueístas de direita desenham a esquerda como se fosse uma sanguinária vilã, desejosa de destruir as famílias brasileiras, tomar os bens da classe média, criminalizar os relacionamentos heterossexuais e impor um regime totalitário que enterraria para sempre as liberdades individuais da população. Demonstram, nessa atitude, que não estão dispostos a debater, mas sim a intolerantemente atacar e destruir seus opositores, com ódio e autoritarismo.
8. Controle psicológico das pessoas, por meio da incitação ao medo, ao ódio e ao fanatismo
O controle das massas é um desejo de parte dos movimentos e páginas de reacionarismo no Brasil. É visível a iniciativa deles de manipular o que as pessoas pensam e creem, através de recursos escusos como o apelo ao medo contra o “comunismo” e a continuidade do mandato de Dilma, a incitação ao ódio irracional contra o PT e o açulamento do seu público-alvo de modo que se torne um “exército” de fanáticos.
Nessa incitação, as pessoas são induzidas a crer no que eles querem que creiam. São convencidas, pelo medo de ter seus bens confiscados e suas famílias desagregadas à força, de que a esquerda ou o PT querem implantar uma “ditadura comunista” – se não já implantaram – e, por isso, devem ser perseguidos e eliminados. Como exemplo disso, novamente a páginaRevoltados Online é evocada, por seu linguajar fortemente agressivo e suas tentativas de induzir crenças fanáticas, medo e ódio nos seus seguidores.
9. Preconceito
O preconceito contra a esquerda, o PT e inúmeras minorias políticas é uma constante em páginas de direita, seja de maneira explícita, seja de forma sutil. Homofobia, lesbofobia, machismo, elitismo, racismo (velado ou explícito), transfobia, xenofobia, gordofobia, intolerância religiosa, intolerância política etc. são comuns de se ver no conteúdo panfletário da direita.
É muito frequente ver ofensas misóginas, gordofóbicas e lesbofóbicas contra Dilma em páginas reacionárias. Também não é raro ver gente defendendo, do alto de seu preconceito elitista, que pessoas beneficiárias do Bolsa Família tenham seu direito político ao voto cassado. O ódio homo-lesbofóbico e misógino também é lugar-comum, já que o reacionarismo no Brasil é inspirado, em parte, no fundamentalismo evangélico e católico, no militarismo e em outras milenares tradições patriarcais.
Fica evidente que o “Brasil ideal” defendido pela direita brasileira contemporânea é um país onde, além de haver o império do autoritarismo, as minorias políticas são constantemente perseguidas, praticamente não têm direitos e são obrigadas a prestar submissão aos homens cisgêneros brancos heterossexuais cristãos (fanáticos) e ricos.
10. Autoritarismo
Por mais “liberal” ou “libertária” que às vezes se tente intitular, e por mais que use as palavras “livre” e “liberdade” em seus discursos, a parcela mais visível da direita brasileira tem o autoritarismo em sua essência. Sua “defesa da liberdade” deixa muito evidente o quanto é uma farsa, ao negligenciar por completo a defesa das liberdades individuais não econômicas para a maioria da população – pertencente a uma ou mais minorias políticas – e defender o silenciamento violento da esquerda e das demandas sociopolíticas dos desfavorecidos por parte do aparelho repressor do Estado. E é comum vê-la não só defendendo, como também praticando, o autoritarismo em suas posições.
Isso é percebido, por exemplo, quando páginas de direita consideram a simples expressão política discordante uma “violação” moral, tachando quem não concorda com uma ou mais posições defendidas de “comunistas”, “esquerdistas” e/ou “petralhas”, demonizando-os e bloqueando-os, ou então respondendo-os com grosseria e má vontade.
Essas páginas e movimentos parecem esperar que sua audiência diga amém a tudo que falam e argumentam. Dizem “defender a liberdade” mas são os primeiros a hostilizar e censurar quem pensa diferente. Tentam empurrar goela adentro da sociedade, longe de submeter à dialética aprimoradora de ideias, suas crenças político-ideológicas. É uma postura vista mais em páginas reacionárias, como o perfil do ideólogo extremista Olavo de Carvalho no Facebook.
11. Teorias da conspiração e paranoia
De vez em quando, destacam-se as teorias da conspiração na fala de formadores de opinião direitistas, como o mesmo Olavo de Carvalho. Segundo eles, há uma conspiração “comunista”, atribuída ao Foro de São Paulo, tramando a “destruição da família”, o “confisco da propriedade privada”, a “proibição” da heterossexualidade, a implantação de um “governo comunista continental” e outras supostas providências consideradas absurdas e inaceitáveis. Como “solução”, defendem ora um golpe militar, ora a eleição de algum radical mão-de-ferro de direita, entre outras que desaguam na perseguição política violenta contra a esquerda e na eliminação das liberdades políticas.
Esse conspiracionismo trabalha aquilo que na verdade é um espantalho, uma fantasia sobre os verdadeiros objetivos e interesses da esquerda brasileira. E muitos direitistas promovem essa fantasia com o intuito de instigar a população para que tenha medo da esquerda e ódio irracional contra o PT, o PSOL, outros partidos originalmente defensores dos interesses populares e os movimentos sociais. Uma população dominada pelo medo e induzida ao ódio é muito mais fácil de se arrebanhar e controlar para que sirva de massa de manobra para defender e facilitar interesses alheios, como será mostrado mais adiante.
12. Projeção psicológica, inversão de fatos
A Wikipédia define a projeção psicológica como “um mecanismo de defesa no qual os atributos pessoais de determinado indivíduo, sejam pensamentos inaceitáveis ou indesejados, sejam emoções de qualquer espécie, são atribuídos a outra(s) pessoa(s)”. É algo extremamente comum na direita brasileira.
É corriqueiro ver os mesmos opinadores ou formadores de opinião direitistas sendo autoritários e acusando a esquerda de autoritária, promovendo múltiplos preconceitos e intolerâncias e tachando-a de preconceituosa e intolerante, defendendo ditaduras de direita e tachando militantes de esquerda de “comunistas totalitários” – mesmo que sejam na verdade opositores de ideologias socialistas autoritárias -, acusando seus opositores de serem “contra a família” enquanto eles mesmos defendem a negação e rejeição contra famílias não “tradicionais” e a desagregação de muitas famílias heterossexuais nucleares, entre diversos outros exemplos.
A direita costuma tentar atribuir ao outro lado desqualidades que na verdade são características ou objetos de defesa constante dela. Tenta assim parecer palatável para a maioria da população, historicamente castigada pelas desigualdades sociais, pelas crises econômicas e por governos capengas, e assim conquistá-la pelo coração e fazê-la ter ódio e preconceito contra a esquerda.
13. Apresentação de “soluções” simples, fáceis e rápidas para problemas complexos e de tratamento difícil e demorado
Tem sido muito comum, nesses últimos anos, “denunciar” problemas como a corrupção, a iniquidade governamental e a falta de honestidade na política e apresentar supostas “soluções” simples, fáceis e rápidas. Tem-se insistido, por exemplo, que a remoção forçada de Dilma da presidência e a criminalização do PT irão “acabar com a corrupção” ou diminuí-la severamente.
Esse discurso se baseia na falácia de que o PT é o partido mais envolvido em escândalos de corrupção na história do país, muito mais do que, digamos, o PSDB, o PMDB, o DEM e o PP. Isso quando não se deixa a entender que o Partido “dos Trabalhadores” é o único partido abrigador de corruptos no Brasil.
Omite-se espertamente que a corrupção tem raízes profundas e multicentenárias, senão milenares, na história cultural e política brasileira (ou ocidental), tendo sido forte em todos os governos presidenciais, imperiais e coloniais no país. Esconde-se que bastará muitíssimo mais do que a remoção de um único partido e uma única autoridade do jogo para que ao menos se diminua e se desempodere a cultura da desonestidade e do “jeitinho”.
Outros exemplos de “soluções” mágicas apresentadas para problemas difíceis são o recrudescimento e brutalização das ações policiais para “acabar” com a violência urbana, a militarização e/ou privatização do ensino para eliminar os problemas da educação pública, a entrega do SUS a empresas privadas para “solucionar” a precariedade da saúde pública e a restauração da educação doméstica religiosa moralista e fortemente autoritária para se “combater” a criminalidade juvenil e a erotização de adolescentes.
14. (Falsas) Dicotomias
A direita reacionária brasileira é especializada em forjar e forçar dicotomias na tentativa de “entender” o mundo. Divide a sociedade entre “bons” e “maus”, “cidadãos de bem” e “bandidos vagabundos”, “direitistas patriotas defensores da liberdade e da democracia” e “esquerdistas comunistas que querem destruir a civilização e provocar o caos”, entre outras tantas divisões maniqueístas.
É esse pensamento em preto-e-branco que faz reacionários acreditarem em absurdos como os seguintes:
– É contra a pena de morte e a violência da polícia? Então tem pena de bandidos e defende a impunidade.
– Relativiza o antipetismo radical de direita? Então é petista e venerador de Lula.
– Vê algo de errado nos discursos da direita “contra a corrupção”? Então é defensor de corruptos.
– É contra as privatizações e a diminuição do Estado? Então é comunista (stalinista) e defende um super-Estado totalitário.
– Vai a protestos (de esquerda)? Então é desocupado vagabundo e não trabalha.
– Defende o direito das diferentes famílias? Então é contra a família tradicional pai-mãe-filhos.
– É de esquerda? Então é comunista e odeia “cidadãos de bem”.
– É contra o conservadorismo? Então defende que a sociedade mergulhe no caos.
– Defende algumas políticas empreendidas pelo PT? Então é petista roxo.
Bônus: arrebanhamento das massas em torno de interesses privados
Todas essas estratégias concentram-se num objetivo maior: arrebanhar as massas, controlá-las psicologicamente e torná-las massa de manobra para a defesa de interesses privados que, não percebem elas, atentarão diretamente contra sua dignidade, seus direitos, suas liberdades e suas prerrogativas democráticas.
Fica muito evidente que a maioria da direita brasileira não está afim de debater ideias e bandeiras a sério, racional e honestamente. Aliás, ela é interessada na manutenção da ignorância sociopolítica da população. A falta de conhecimento suficientemente aprofundado sobre os problemas sociais, políticos, econômicos, ambientais, jurídicos etc. do Brasil e do mundo, assim como a carência de senso crítico, torna a sociedade vulnerável a acreditar em tudo o que a direita diz através de seus ideólogos e formadores de opinião, mesmo que eles incidam nas catorze desonestidades descritas neste artigo.
Graças a esses métodos sujos, a opinião pública adere a essas crenças político-ideológicas e, de quebra, é induzida a emoções como medo e ódio e a posturas fanáticas e intolerantes de aversão àqueles que são alvos dos ataques vindos dos direitistas. Fica pronta assim a fórmula para a mobilização de protestos e outros comportamentos coletivos demandando, por exemplo, a derrubada ilegal de Dilma Rousseff do poder, a criminalização do PT e a eleição de um presidenciável conservador mão-de-ferro, sob pretextos ingênuos como o “combate à corrupção” e a “defesa da democracia”.
No final das contas, as massas acabam opondo-se ao que poderia ser a sua chance de redenção – as lutas dos movimentos sociais, as bandeiras de direitos da esquerda, o avanço da democratização na cultura política brasileira etc. – e defendendo, sem saber, interesses nada públicos, como a perpetuação e fortalecimento do poder político oculto (ou visível), do lucro e dos privilégios de grandes empresários, magnatas da comunicação e políticos conservadores nada honestos ou democratas.
Essa desonestidade sistemática da parcela mais visível da direita formadora de opiniões precisa ser denunciada com frequência. E novas estratégias precisam ser pensadas para se impedir que ela continue enganando, cativando e arrebanhando mentes e corações em torno de uma desconexa fantasia que poderá resultar em graves danos à democracia e às liberdades e direitos individuais e coletivos, incluindo até mesmo o direito à vida e à integridade físico-psicológica e a dignidade humana, no Brasil.
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